Quem morou em Curitiba nos anos oitenta e se lembra dessa época, certamente vai recordar do Parque Alvorada. Ficava bem próximo do Passeio Público. Dessa época lembro que quando menino ainda esperava a semana inteira para ir com o meu pai passar a manhã nos dois lugares. Íamos no Parque onde o carrinho bate-bate rendia risadas de um homem que via em seu filho a sua própria imagem. As manhãs invariavelmente eram encerradas no Passeio Público com pastéis fritos na hora vendidos em porções (os palitos eram bipartidos em uma das pontas). Hoje pensei nisso: quanta saudade! Logo em seguida, fui aliviado por pensar: “ao menos tenho um bom passado para poder lembrar”. O tempo passou e muitas coisas boas, obviamente ruins também, foram acontecendo a todos, inclusive a quem está lendo isso agora. As melhores impressões e lições vêm de grandes homens. Meu pai foi uma pessoa marcante e isso era visto até mesmo em seu aperto de mão e nos conselhos. Em dezenove dias, experimentei a felicidade da esperança e a dor da perda deste grande ser. A sua última lição presencial, me foi dada de um modo um tanto inusitado. Quem passa um certo período dentro de uma UTI de hospital corre um sério risco de sofrer alucinações. A este fato alguns médicos chamam de “uteísmo”. Pudera: imagine passar dias a fio quase sem se mexer e sem ter noção do que é dia ou noite. Pois bem, nesta última semana, em uma das rápidas visitas permitidas, o pai apontou com o indicador e médio juntos para as lâmpadas da foto (exatamente no ângulo em que foram tiradas) e me disse: “Olha ali filho, são dois cachorrinhos bem bonitos, um branquinho, um marrom e um carneirinho. Tadinho, olha como está magrinho o carneirinho”. Confesso que virei o rosto pra não chorar na sua frente. Me segurei pra não perder tempo de visita de 15 minutos. Sem pensar concordei na hora e disse: “pai, realmente eles são muito bonitos”. Eu sou sincero em dizer que não sei explicar direito. A calma dele me mostrava que ali estava a última lição. Já sinto a presença do meu lado, meu velhão! Por isso, dessa vez, não me despeço.
quinta-feira, 26 de maio de 2011
Uteísmo e a grande lição
Quem morou em Curitiba nos anos oitenta e se lembra dessa época, certamente vai recordar do Parque Alvorada. Ficava bem próximo do Passeio Público. Dessa época lembro que quando menino ainda esperava a semana inteira para ir com o meu pai passar a manhã nos dois lugares. Íamos no Parque onde o carrinho bate-bate rendia risadas de um homem que via em seu filho a sua própria imagem. As manhãs invariavelmente eram encerradas no Passeio Público com pastéis fritos na hora vendidos em porções (os palitos eram bipartidos em uma das pontas). Hoje pensei nisso: quanta saudade! Logo em seguida, fui aliviado por pensar: “ao menos tenho um bom passado para poder lembrar”. O tempo passou e muitas coisas boas, obviamente ruins também, foram acontecendo a todos, inclusive a quem está lendo isso agora. As melhores impressões e lições vêm de grandes homens. Meu pai foi uma pessoa marcante e isso era visto até mesmo em seu aperto de mão e nos conselhos. Em dezenove dias, experimentei a felicidade da esperança e a dor da perda deste grande ser. A sua última lição presencial, me foi dada de um modo um tanto inusitado. Quem passa um certo período dentro de uma UTI de hospital corre um sério risco de sofrer alucinações. A este fato alguns médicos chamam de “uteísmo”. Pudera: imagine passar dias a fio quase sem se mexer e sem ter noção do que é dia ou noite. Pois bem, nesta última semana, em uma das rápidas visitas permitidas, o pai apontou com o indicador e médio juntos para as lâmpadas da foto (exatamente no ângulo em que foram tiradas) e me disse: “Olha ali filho, são dois cachorrinhos bem bonitos, um branquinho, um marrom e um carneirinho. Tadinho, olha como está magrinho o carneirinho”. Confesso que virei o rosto pra não chorar na sua frente. Me segurei pra não perder tempo de visita de 15 minutos. Sem pensar concordei na hora e disse: “pai, realmente eles são muito bonitos”. Eu sou sincero em dizer que não sei explicar direito. A calma dele me mostrava que ali estava a última lição. Já sinto a presença do meu lado, meu velhão! Por isso, dessa vez, não me despeço.
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